MARLEY MENDONÇA ALVES

domingo, 15 de março de 2015

PALESTRA Prof.Dr. MARLEY MENDONÇA ALVES TEORIA GERAL DO DIREITO VISTO, LIDO E OUVIDO

RESUMO
A compreensão do fenômeno jurídico passa além do estudo de um ordenamento positivado em um Estado determinado, o qual prescreve o conjunto das normas jurídicas a serem observadas, sob pena de aplicação das sanções prescritas, na hipótese de seu descumprimento. O desenvolvimento de uma Teoria Geral do Direito teve por escopo inicial a própria afirmação da autonomia do Direito enquanto ciência. Não sem razão que a Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen, apresenta-se como a Teoria Geral do Direito de maior repercussão do século XX. Pode-se entender isso a partir do próprio texto de Kelsen, em Teoria Pura do Direito, onde ele deixa claro que a moral no Direito existe, porém não faz parte da Ciência Jurídica; e também expõe o risco de se reconhecer o direito estatal como legitimado aprioristicamente. Esta última dá a entender uma preocupação com ideologias enraizadas fora do Estado, ou seja, o Estado é a segurança e o que está fora dele pode ser despótico. A Teoria Geral do Direito teve seu conteúdo dilatado de modo a incluir as novas descobertas das ciências sociais e os conhecimentos linguísticos-teoréticos e hermenêuticos.  A norma jurídica teria que ser adotada por adesão espontânea voluntária, mas há oposição ao cumprimento da norma, por isso se faz necessário o uso da coação. Assim, a coação só é observada na hipótese da não efetividade do cumprimento legal. A Moral, porém, não precisa de elemento coativo. É incoercível, mas nem por isso a norma da Moral deixa de exercer certa intimidação, pois, para a sociedade, ela é valiosa e o não-cumprimento desta provoca reação por parte dos membros da sociedade. E essa intimidação exerce caráter punitivo e também intimidativo. Segundo Miguel Reale, a teoria do mínimo ético, exposta pelo filosofo inglês Jeremias Bentham e depois desenvolvidas por vários autores, diz que o Direito é o mínimo da Moral, declarado obrigatório para que a sociedade possa sobreviver. Como nem todos podem ou querem realizar de maneira espontânea as obrigações morais, é indispensável armar de força certos preceitos éticos, para que a sociedade não soçobre. A Moral, em regra, dizem os adeptos desta doutrina, é cumprida de maneira espontânea, mas como as violações são inevitáveis, é indispensável que se impeça, com mais vigor e rigor, a transgressão dos dispositivos que a comunidade considerar indispensável à paz social. Assim sendo, o Direito não é algo diverso da Moral, mas é uma parte desta, armada de garantias especificas. Miguel Reale conclui que "tudo o que é jurídico é Moral, mas nem tudo o que é Moral é jurídico".  Desse modo, a moderna Teoria Geral do Direito trata da conceituação do Direito, da estrutura da norma jurídica e do ordenamento jurídico, da teoria das fontes do Direito, da interpretação das normas jurídicas e das técnicas de colmatação das lacunas supostamente observáveis no ordenamento jurídico, além da estrutura das relações jurídicas. O Direito garante o cumprimento social das normas e a Moral, com seus princípios e valores, regulamenta as relações mútuas para o indivíduo e o Estado. A relação entre a Moral e o Direito é historicamente mutável, muda quando muda historicamente o conteúdo de sua função social. A História do Direito tem registrado uma constante disputa com a Moral – a visão ética da humanidade, as quais o homem encontraria naturalmente por meio da razão. O Direito positivado apenas cuidaria de tutelar, os preceitos naturais da ética, individualizando-os objetivamente nas leis.


SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 7
1.1 Concepção do Direito................................................................................... 7
2 DIREITO E NORMAS....................................................................................... 10
2.1 Norma Jurídica.............................................................................................. 10
2.1.1 Natureza das normas jurídicas............................................................. 12
2.1.2 Funções das normas jurídicas............................................................. 13
3  ConceitoS jurídicos fundamentais............................................ 14
4 Direito como Sistema juridico......................................................... 20
5 FUNÇÃO DO DIREITO.................................................................................... 23
6 A TEORIA GERAL DO DREITO.................................................................... 31
6.1 A Distinção entre o Direito e a Moral....................................................... 32
6.2  Paralelo entre o Direito e a Moral............................................................ 33
6.3 Direito e Coação........................................................................................... 34
6.4 A Coercibilidade do Direito e a Incoercibilidade da Moral................. 35
6.5 Direito e Heteronomia................................................................................. 36
5.6 Bilateralidade Atributiva............................................................................. 36
7 Direito e teoria politica...................................................................... 38
7.1 A Doutrina da Justiça de Aristóteles....................................................... 38
7.2 A Doutrina do Direito Natural.................................................................... 40
7.3 Juízos de Valor na Ciência do Direito..................................................... 42
7.4 O Direito e o Estado Social........................................................................ 42
7.5 O Paradigma do Estado Social de Direito.............................................. 49
7.6 A Distinção entre Estado Social e Estado Socialista.......................... 53
7.7 O Paradigma do Estado Democrático de Direito................................. 54
CONCLUSÃO....................................................................................................... 63
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................. 66



A concepção do direito aparece, em geral, como resultado  de diferentes influências. Sendo a expressão da vontade do corpo social, tudo o que agir sobre a sociedade terá reflexo no Direito. Pode influenciar, ainda, em diversos fatores de evolução, como econômicos, políticos, culturais e moral.
Observa-se um progressivo alargamento do objeto de estudo da Teoria Geral, consoante lição de Larenz[1]:
Anteriormente falava-se de uma “teoria geral do Direito” e entendia-se por tal uma doutrina acerca da estrutura lógica da norma jurídica, acerca de certos conceitos fundamentais que podem encontra-se em todos os ordenamentos jurídicos desenvolvidos, como por exemplo, “lícito e ilícito”, dever ser, ter a faculdade, poder, comando, proibição, permissão, sujeito jurídico e objeto de direitos e sobre as relações lógicas destes conceitos fundamentais entre si e os modos de pensamento da Jurisprudência, sendo assim, no essencial, um traço de união entre a lógica e a Jurisprudência. Procurava-se neste campo chegar a conhecimentos respeitantes ao direito universalmente válido face a um determinado ordenamento jurídico “positivo”, e, em rigor, essencialmente mediante uma perspectiva normativa e que não suportassem o lastro prévio de pressupostos ontológicos ou metafísicos. A Teoria Geral do Direito teve seu conteúdo dilatado de modo a incluir as novas descobertas das ciências sociais e os conhecimentos lingüísticos-teoréticos e hermenêuticos.
O direito vem como "um sistema de regras da vida social que têm validade efetiva"[2]. O homem é um ser situado que se relaciona com o mundo material de determinado modo, dele retirando sua sobrevivência e a partir dele constituindo suas relações sociais. É o que se lê em Marx[3]:
As categorias econômicas nada mais são que as expressões teóricas, as abstrações das relações sociais (...). Os mesmos homens que estabelecem relações sociais em conformidade com sua produtividade material produzem os princípios, as idéias e as categorias igualmente em conformidade com suas relações sociais.
Ainda segundo Marx & Engels[4], “(...) a ilusão de que a lei repousa sobre a vontade e, o que é melhor, sobre uma vontade livre, desligada de sua base concreta. Assim também, por sua vez, o direito é aproximado da lei”.
O Direito exprime a vontade do corpo social, não pode ele ser unificado , a não ser que a vontade coletiva fosse idêntica em todas as partes, e, pelo que se entende, isso não ocorre. Mantidas as diferenças sociais e históricas, demarcadas pelas dessemelhanças dos traços culturais maturados no processo de civilização, o Direito permanece pluralizado, adequado e orientando a vida organizacional das diferentes sociedades
O Direito é sempre enunciado e formulado com o propósito de orientar condutas individuais e coletivas, além de estar também empenhado em resolver problemas que, na maioria das vezes, dão origem a diferentes sistemas jurídicos. Aguiar[5] assevera que "o direito respaldaria sua existência concreta num supradireito ou em princípios superiores que estariam situados na razão, na natureza humana ou na vontade de Deus".
O processo socializador, como meio de integração, leva os indivíduos, em primeiro tempo, à aceitação do complexo valorativo estruturado, porque imposto. Em segundo tempo, a própria educação encarrega-se de despertar a consciência das diferenças de estratos sem condições de justificá-las. Castro[6] ressalta que se "procura explicá-las em termos de controle, embasa-se no fetichismo da representação".
O direito assume a função social e o bem comum de estar diretamente orientado pelas diferentes manifestações dos grupos sociais ou de sociedades como um todo, no sentido de buscar atingir o bem-estar social, do modo mais coeso possível.
O Direito, para Aguiar[7], é, pois, "a ideologia que sanciona, é a linguagem normativa que instrumentaliza a ideologia do legislador ou a amolda às pressões contrárias, a fim de que sobreviva".
Para Hans Kelsen[8], “(...) A lei jamais obriga e dá liberdade para que o indivíduo a cumpra ou não. No entanto, caso não a cumpra, cabe a ele sujeitar-se às sanções”.
Conclui-se que a concepção do direito surge do ponto de vista social, dado que a sociedade é o espaço definido pelas desigualdades dos mais variados sistemas: econômico, político, ideológico, cultural e psicológico. Não há identidades, a não ser nas situações intragrupos, onde uns dominam e controlam e, outros, defendem-se e se rebelam contra a ordem estabelecida, fazendo a continuidade materializada da vida social, que é a própria historicidade do social.


A norma jurídica é norma de conduta e norma de composição de conflitos. Por serem as normas aplicáveis a todos e a todas as relações são chamadas, genérica ou universais, também são abstratas, porque não se referem a casos concretos e sim abstratos, quando de sua elaboração. As normas de conduta, em regra, são normas obrigatórias, isto é, de observância necessária, sob pena de o direito não atingir o seu objetivo, caso não o fosse. A norma jurídica e o  direito  são indispensáveis entre si. Desde os tempos mais remotos, o homem procura viver em grupos, em sociedade.
A obrigação é elemento fundamental do direito, cria uma obrigação ou dever para outrem, e vice-versa. A noção de direito está intimamente ligada à obrigação, pois as pessoas estão habituadas a obedecer às normas a tal ponto que não sentem o peso dessa obrigação, pois corresponde ao modo de se pensar e sentir, tal o condicionamento social.
No momento que se transgride qualquer dessas normas, toma-se consciência da sua obrigatoriedade, pois se tem que responder pelas consequências. Alguns autores, em lugar de obrigatoriedade, preferem falar em coercibilidade da norma, para indicar que ela envolve a possibilidade jurídica da coação. Assim, ao contrário das normas sociais, a jurídica se caracteriza pela coercibilidade e sua inobservância gera a possibilidade de sanção, ou seja, para todos aqueles que descumprirem uma norma jurídica há a possibilidade de sofrer uma sanção.
No descumprimento de uma norma jurídica, ou seja, um dever de fazer uma prestação, existe a geração de um conflito, e o conflito gera um litígio e este, por sua vez, quebra o equilíbrio e a paz social. A sociedade não tolera o litígio porque necessita de ordem e equilíbrio nas suas relações. Por isso tudo, ela faz tudo para evitar e prevenir conflitos, primeira e principal função do direito.
Muitos acreditam que o direito tem caráter essencialmente repressivo, mas na realidade não o tem. O direito existe muito mais para prevenir do que para corrigir, e muito mais para evitar que os conflitos ocorram do que para compô-los. A observância da norma previne conflitos, mas às vezes é inevitável porque nem todos se submetem às normas impostas pelo direito. Surgindo um conflito, há que ser solucionado.
Superar conflitos de interesse é o que se chama de composição. Composição de conflitos não consiste em fazer desaparecer o conflito, pois isso seria impossível, por mais que se procure preveni-los. A maneira de solucionar o conflito é colocar os dois interesses em antagonismo na balança, e determinar qual o que deve prevalecer e qual o que deve ser reprimido. Esse é o sentido de toda composição.
Norma jurídica tem por finalidade regular as atividades das pessoas em suas relações sociais.
Os conceitos de norma jurídica, segundo alguns juristas, são:
 Hans Kelsen[9]: Com o termo “norma” se quer significar que algo deve ser ou acontecer, especialmente que um homem se deve conduzir de determinada maneira.
 Miguel Reale[10]: Há regras de direito cujo objetivo imediato é disciplinar o comportamento dos indivíduos, ou as atividades dos grupos e entidades sociais em geral; enquanto que outras possuem um caráter instrumental, visando a estrutura e funcionamento de órgãos, ou a disciplina de processos técnicos de identificação e aplicação de normas, a fim de assegurar uma convivência juridicamente ordenada.
 Paulo Dourado de Gusmão[11]: São regras de conduta, impostas heteronomia ou reconhecidas pelo Poder Público, compostas de preceito e sanção. Algumas normas jurídicas não terão a sanção escrita, mas está implícita.
Pertencendo ao mundo da ética, daquilo que deve ser, a norma jurídica opera com modais deôntico de proibição, de obrigatoriedade e de permissão. Dessa forma, a norma jurídica, ao se dirigir ao destinatário, proíbe e obriga.
O modal de permissão não gera um comando que deve ser obedecido. Ele dá uma prerrogativa ao destinatário, para que este dela se utilize quando quiser. Muitas vezes tais modais surgem misturados, no amplo complexo de normas jurídicas que compõem o ordenamento.
As normas jurídicas são padrões de condutas sociais, impostas pelo Estado para uma possível convivência dos homens na sociedade. Segundo essa visão, a norma vem do Estado. Diferentemente do pluralismo e  do jusnaturalismo,
Se uma pessoa age bem para ser recompensada ou por medo da punição, é difícil dizer até que ponto se pode considerar que ela esteja propriamente agindo bem: até que ponto seu comportamento é ético.
Quanto à natureza, as normas jurídicas são essencialmente sociais e éticas, posto que visam estabelecer padrões de conduta, isto é, linhas e ideias de comportamentos, amoldando o modo de agir de cada indivíduo perante o seu grupo para fins de estabelecer uma sociedade harmoniosa, organizada e ordenada.
Sendo as normas jurídicas essencialmente éticas, lógico é que mantenham íntimas vinculações com as demais normas do mesmo tipo morais e religiosas, delas recebendo uma grande influência.
Vislumbrando-se a norma jurídica sob o sentido funcional, constata-se que ela tem por escopo estabelecer uma definição das relações do homem em sociedade. É justamente voltada para tal propósito que ela se põe em evidencia, constituindo direitos, impondo obrigações e fixando sanções.
A norma jurídica atua sempre coercitivamente; ela coage, impõe, é imperativa. Por meio dela, a maneira de agir de cada indivíduo sofre um rígido processo de amoldamento, adaptando-se ao convívio com os semelhantes.


O Direito é, pois, "a ideologia que sanciona, é a linguagem normativa que instrumentaliza a ideologia do legislador ou a amolda às pressões contrárias, a fim de que sobreviva"[12].
            Decorrem os  deveres, obrigações e se impõe à conduta de todas as pessoas no convívio familiar, nas relações de trabalho e nos vínculos religiosos. A solução dos conflitos, com base no direito e mediação do Estado, torna possível a vida em sociedade.
Ele formata o conjunto de normas obrigatórias que disciplinam as relações humanas e também a ciência que estuda essas normas. A ciência jurídica tem por objeto discernir, entre as normas que regem a conduta humana, as que são especificamente jurídicas. Caracterizam-se estas pelo caráter coercitivo, pela existência de sanção, no caso de não observância, e pela autoridade a elas conferida pelo Estado, que as consagra.
Estudar-se-á agora a evolução histórica do direito, a começar pela Grécia. A maior contribuição do pensamento grego para o direito foi a formação de um corpo de ideias filosóficas e cosmológicas sobre a justiça, mais adequado para apelações nas assembléias populares do que para estabelecer normas jurídicas aplicáveis a situações gerais. As primitivas cosmologias gregas consideravam o indivíduo dentro da transcendental harmonia do universo, emanada da lei divina (logos) e expressa, em relação à vida diária, na lei (nomos) da cidade (polis).
No século V a.C., os sofistas, atacados mais tarde por Sócrates e Platão, examinaram criticamente todas as afirmações relativas à vida na cidade-Estado, destacando as amplas disparidades entre a lei humana e a moral, rejeitando a ideia de que a primeira obedecia necessariamente a uma ordem universal. O objeto de estudo dos sofistas era o homem, "a medida de todas as coisas"; segundo Protágoras, o sujeito, capaz de conhecer, projetar e construir. Eles negavam que a lei e a justiça tivessem valor absoluto, pois eram criadas pelos homens, de acordo com determinadas circunstâncias, e, por isso mesmo, relativas e sujeitas a transformações.
Platão criticou esse conceito e contrapôs ao que considerava como subjetivismo sofista a eternidade das formas arquetípicas, de que a lei da cidade-Estado seria um reflexo. Na utopia descrita em sua República, Platão afirma que a justiça prevalece quando o Estado se encontra ordenado de acordo com as formas ideais asseguradas pelos sábios encarregados do governo. Não há necessidade de leis humanas, mas unicamente de conhecimentos transcendentais.
Aristóteles, discípulo de Platão, que tinha em comum com ele a ideia de uma realidade que transcende a aparência das coisas, tais como são percebidas pelos sentidos humanos, defendia a validade da lei como resultado da vida prática: o homem, por natureza, é moral, racional e social e a lei facilita o desenvolvimento dessas qualidades inatas.
A concepção do direito natural, como emanação do direito da razão universal, foi obra da filosofia estóica. O ideal ético dessa doutrina, iniciada na Grécia e de grande influência no pensamento romano, foi sintetizado no século III de nossa era por Diógenes Laércio: a virtude do homem feliz e de uma vida bem orientada consiste em fundamentar todas as ações no princípio da harmonia entre seu próprio espírito e a vontade do universo.
No direito romano: Os criadores da civilização romana, cujo espírito prático, senso da realidade e tendência para o individualismo equilibrava-se com um raro discernimento da conveniência e da necessidade política, edificaram o mais grandioso e perfeito sistema jurídico da idade antiga, o qual sobrevive num sem-número de concepções, instituições e princípios vigentes no mundo contemporâneo. O direito romano influiu poderosamente sobre a ordem jurídica do Ocidente e constituiu um dos principais elementos da civilização moderna.
A expressão direito romano, em sentido amplo, indica o conjunto de normas e princípios jurídicos fixados pela civilização romana. Sua história abrange cerca de 13 séculos, iniciada com as origens lendárias da cidade de Roma, em meados do século VIII a.C., e se convencionou considerar encerrada na data da morte do imperador Justiniano, no ano 565.
Os mestres e expositores do direito romano costumam dividir sua longa história em períodos, adotando critérios diversos para distingui-los. O direito romano antigo, também denominado ius quiritium ou ius civile , era o direito vigente desde a formação da cidade até a codificação da célebre Lei das Doze Tábuas, aproximadamente em 450 a.C.
No Direito germânico: A expressão direito germânico indica as instituições e os sistemas jurídicos existentes nas diversas nações bárbaras de origem teutônica que se apossaram da Europa após a queda do Império Romano do Ocidente, no ano 476. Predominava entre os invasores o direito de origem costumeira, particularista, rudimentarmente desenvolvido e fortemente impregnado de sentido comunitário. Os usos da tribo ascendiam à categoria de lei mediante sua definição pelo órgão judicial, a assembléia, no julgamento dos casos concretos. As decisões constituíam precedentes e se aplicavam com força legal. O direito era, ao mesmo tempo, de origem popular e judicial, conservado pela tradição oral.
Importante característica do direito germânico era a chamada personalidade das leis. O direito romano, pelo menos depois que o império atingiu a expansão máxima, no século II, consagrava, ainda que com exceções, o princípio da territorialidade, segundo o qual o direito aplicável às pessoas que se acham no território do Estado é o direito do próprio Estado, independentemente da condição nacional ou da origem étnica de seus habitantes.
O direito germânico, ao contrário, principalmente depois que se generalizou a convivência com a população romana, nos séculos IV e V, considerava que o estatuto legal da pessoa era uma prerrogativa desta, determinada por sua procedência ou nacionalidade.
A coexistência entre romanos e bárbaros tornou-se ameaçadora para as instituições e os costumes jurídicos destes últimos, ante o impacto de uma civilização mais avançada. Por outro lado, com o curso do tempo e a ocorrência de frequentes migrações, com casamentos entre pessoas de nacionalidades diferentes e o nascimento de descendentes dessas uniões, a aplicação do direito foi-se tornando problema dos mais difíceis. Alguns reis bárbaros mandavam compilar os direitos de seu povo e os dos povos vencidos, pelo sistema romano de codificação, o que contribuiu para que, aos poucos, se firmasse o princípio da territorialidade das leis.
As leis bárbaras ordenaram os usos e costumes das tribos na forma escrita, recolhendo a influência de princípios do direito romano, mediante compilações do período pós-clássico, das constituições imperiais e da jurisprudência. Nessas codificações, as leis ou a jurisprudência romana podiam aparecer justapostas, sem modificações, ou resumidas, modificadas e intercaladas.
Na Idade Média: O apogeu da escolástica, nome com que se define genericamente a filosofia cristã medieval, deu-se no século XIII, com santo Tomás de Aquino, que, a exemplo de santo Agostinho, subordinou o direito positivo  à lei de Deus. Uma disposição do direito positivo não podia violar o direito natural e, em consequência, o direito eterno divino.
A tendência de fazer prevalecer a razão sobre a vontade foi rejeitada, também no século XIII, pelo franciscano britânico John Duns Scotus, para quem tudo se devia à vontade de Deus e não existia nenhum direito natural acessível à razão humana. O direito positivo somente tinha validade e eficácia se não contrariasse a vontade divina superior a ele.
Do Renascimento ao século XVIII: Em O príncipe, de Maquiavel, obra de 1513, atacou o recurso à vontade transcendental e à vontade divina para mergulhar no empirismo: as coisas devem ser aceitas como são e não como se considera que deveriam ser. A manutenção do poder justifica qualquer meio, pois é um fim em si mesmo. O direito deve basear-se na garantia de continuidade do poder e não na justiça.
Montesquieu[13] foi um dos pioneiros a rejeitar o direito natural. Em  L'esprit des lois (1748 – O espírito das leis) defendeu a tese segundo a qual o direito e a justiça de um povo são determinados por fatores que operam sobre eles e, portanto, não é aplicável o princípio da imutabilidade sustentado pelo direito natural. Kant também discutiu o direito natural: segundo ele, todos os conceitos morais são baseados no conhecimento a priori, que só pode ser atingido por intermédio da razão. No entanto, os conceitos kantianos mostraram-se tão transcendentais quanto os do direito natural e por isso outros pensadores do idealismo metafísico, como Johann Gottlieb Fichte, voltaram às noções tradicionais do direito natural.
A teoria pura do direito, cujo mais conhecido representante foi o austríaco Hans Kelsen[14], concebia o direito como um sistema autônomo de normas baseado numa lógica interna, com validade e eficácia independentes de valores extrajurídicos, os quais só teriam importância no processo de formação do direito. A teoria das leis é uma ciência, com objeto e método determinados, da qual se infere que todo sistema legal é, essencialmente, uma hierarquia de normas.
As escolas modernas do realismo jurídico entendem o direito como fruto dos tribunais. Dentro de sua diversidade, essas escolas admitem princípios comuns: a lei decorre da ação dos tribunais; o direito tem um propósito social; as mudanças contínuas e ininterruptas da sociedade se verificam também no direito; e é necessário distinguir o que é do que deve ser.
O conceito atual do direito se configura como uma rebelião contra o formalismo. A maior parte das tendências evita definir-se exclusivamente em função de um único fator e admitem tanto a lógica analítica quanto as questões de índole moral e o enfoque sociológico. Assim, o trabalho jurídico sobre as relações entre o direito e a sociedade levou à integração com outras disciplinas e à melhor compreensão da influência dos fatores econômicos e sociais.



Sistemas jurídicos contemporâneos no Direito ocidental: O direito nas sociedades contemporâneas pode ser classificado, acima dos limites políticos dos estados, em alguns grandes sistemas: o ocidental, que abrange o direito continental europeu, e o direito anglo-americano; o muçulmano; o hindu e o chinês.
Os direitos dos estados que se incluem no sistema ocidental devem suas linhas estruturais às mesmas concepções da tradição filosófica do Ocidente, ao influxo dos princípios da ética cristã e ao predomínio da ideologia liberal. A ordem jurídico-política baseia-se na noção de direitos naturais e invioláveis, entre os quais a liberdade individual em suas várias especificações, que se erige em valor supremo da vida social.
Assenta-se ainda no princípio da soberania popular, no regime representativo e no sistema pluripartidário, no dogma da supremacia da lei, nos princípios da divisão dos poderes e da neutralidade do estado. Na ordem econômica, prevalece o princípio capitalista.
No grupo anglo-americano: Ao direito continental europeu se contrapõe o direito do grupo anglo-americano, constituído do próprio Reino Unido, Irlanda do Norte, País de Gales, Nova Zelândia, Austrália, Canadá , Estados Unidos e outros países. O direito inglês, do qual se originou total ou parcialmente o direito dos estados pertencentes a este grupo, não é um direito de origem romanística, nem sofreu, durante a Idade Média, ou mesmo posteriormente, recepção do direito romano. Sua principal característica, conhecida como sistema da common law, é que nele o direito legislado não constitui a fonte regular e normal do direito. Ao contrário, a lei ou statute law faz-se necessária para determinar a exceção, para estabelecer a norma que foge aos princípios da common law e exige, por isso, uma interpretação restritiva.
A common law não constitui um sistema de direito escrito, ou um direito costumeiro, no sentido que a ciência jurídica dá, em geral, à palavra costume. Afirma-se, entretanto, que o chamado costume geral imemorial é considerado a própria essência da common law. Todavia, esse costume geral imemorial é coisa diversa: consiste no complexo dos princípios que se extraem das decisões proferidas pela justiça real, desde sua instituição no século XIII.
Nos países em que o direito romano foi recebido, o legislador é o promotor do direito, enquanto que, nos países da common law, é a magistratura. Desse modo, no direito inglês, as decisões judiciais dispõem de uma força específica que não se limita à hipótese concretamente resolvida, mas pode estender-se com efeito normativo aos casos futuros que apresentem a mesma configuração e venham a se enquadrar nos mesmos limites. O direito inglês apresenta-se como direito jurisprudencial, como um direito casuístico, ou case law, em que predomina a regra do precedente, temperada pela aplicação do princípio da equidade.
O direito dos Estados Unidos pertence a esse grupo. Nele predomina a concepção da common law e o casuísmo . A lei, no entanto, tem nos Estados Unidos mais importância que nos demais países do grupo, por duas razões principais: o país tem uma constituição rígida, em virtude do que a atividade legislativa é mais intensa; e tendo em vista que o país é uma federação, os estados expedem leis, no âmbito das respectivas competências.
No direito brasileiro: Derivado do direito lusitano transplantado para o Novo Mundo, o sistema jurídico brasileiro se filia ao chamado grupo continental europeu. Suas raízes históricas estão na península ibérica: é nas instituições do direito luso dos séculos XVI, XVII e XVIII que se encontra o ordenamento jurídico que esteve em vigor no Brasil durante um longo período. A importância do antigo direito ibérico para o direito brasileiro e sua história pode ser avaliada pela permanência das Ordenações Filipinas, de 1603, em vigor no Brasil durante mais de três séculos. Essa ordem jurídica não foi abalada pela independência política, em 1822, nem pela queda da monarquia, em 1889. Em matéria penal, no entanto, o livro quinto das Ordenações foi revogado pelo código criminal de 1830. Logo depois, o processo penal passou a regular-se pelo código de processo criminal de 1832.
O código comercial e o regulamento 737, relativo ao código de processo civil, datam de 1850. Com essas poucas exceções, todo o vasto campo das relações jurídicas privadas continuou, mesmo depois de iniciado o século XX, a reger-se pelo código seiscentista, que somente foi revogado a partir de 1º de janeiro de 1917, pelo atual código civil brasileiro, cinquenta anos após sua completa substituição, na antiga metrópole, pelo código civil português de 1867. Embora integrado ao grupo continental europeu, o sistema brasileiro adquiriu, notadamente no campo do direito público, características próprias.


 As normas jurídicas prescrevem ao homem um comportamento externo, voltado para a coletividade, que consiste em fazer ou não fazer. Nesse primeiro aspecto, o direito se distingue das normas que imprimem uma conduta interna, como as fixadas pela moral e pela religião. Quando a moral e a religião condenam ou prescrevem uma conduta externa, decorre esta de uma inspiração interna, que primariamente orienta a conduta. A etiqueta, o costume, o uso e a convenção também obrigam, sob pena de censura social, a uma conduta externa. Não participam, todavia, do direito. Tais normas podem ser violadas livremente, embora a coletividade ou o grupo reaja com manifestações de reprimenda ou desagrado. A violação da norma jurídica acarreta consequências mais profundas e mais organizadas. A norma jurídica, se violada, suscita a coação, capaz de constranger ao cumprimento, com o apelo, em última instância, à força.
Há na constituição e nos códigos diversas prescrições que, embora determinem uma conduta, não suscitam, no desvio, uma reação. Nem todas as regras contidas numa lei, sobretudo as que não consagram a responsabilidade de certas ações, são normas jurídicas. Somente quando a obrigação pode ser coercitivamente imposta se está em presença de uma norma jurídica autêntica.
Toda norma jurídica se desdobra em preceito e sanção. Tipicamente, o direito penal consagra esse padrão: há, em cada artigo de lei, a conduta a seguir e a pena que assegura seu cumprimento. O direito civil, no entanto, limita-se a fixar os preceitos. A enumeração das sanções cabe ao direito processual civil. O direito só se compreende como sistema ou totalidade, que parte da constituição e se espraia nos regulamentos das autoridades públicas.
Na ordem jurídica: As regras vigentes constituem a ordem jurídica, composta de normas que se reúnem, coligam-se e se interpenetram num todo harmônico. O ponto comum entre as prescrições legais é o fato de se vincularem a sanções. As normas têm um limite no espaço e no tempo, que determina sua vigência para uma comunidade, em regra fixada territorialmente. O que lhes infunde autoridade é a intervenção do Estado, que as torna obrigatórias.
O Estado, no direito moderno, é a única instituição que pode constranger ou obrigar as pessoas. Ele, e somente ele, pode equipar a norma jurídica com a coação. Seus poderes, porém, são limitados, disciplinados e espiritualizados pelo direito. O Estado não se circunscreve a um conteúdo de ordem espiritual. Sua existência real se afirma nos homens, que materializam sua vontade e tornam, em seu nome, as decisões obrigatórias para os indivíduos.
O esboço da ordem jurídica prende-se à consideração do direito positivo, desligado da ideia de justiça ou de direito natural. No âmbito dessa diretriz positivista, levada ao extremo, é possível identificar-se muitos abusos e muitas tiranias. Tudo o que é direito obriga, sem consideração à justiça: tudo o que é direito, por ser direito, é justo. Há a ponderar, todavia, que a doutrina se amolda à ideia de justiça, sempre presente no direito positivo, como ideal e como parâmetro. Essa ideia não leva ao direito natural, para cujos partidários somente ele justificaria a validade do direito.
Na norma jurídica, em verdade, não se esgota todo o rico conteúdo do direito. Em seu conceito se agrega o direito como valor e como fato. A sociologia jurídica e a história do direito estudam o fato; a política do direito tem por objeto o valor, e a teoria geral do direito se ocupa da norma. A norma jurídica somente se compreende em referência ao valor, que aponta para a justiça, e ao fato, que se prende às condições sociais e históricas. Embora receba do Estado seu caráter obrigatório, não tem validade somente por esse fundamento. Mesmo editada, ela pode, por falta de consenso, não ser aplicada, pois carente de eficácia. Se divorciada dos valores de justiça, confunde-se com a força pura, sem apoio no conceito de validade universal.
No direito objetivo e subjetivo: No emprego da palavra direito, encerram-se duas significações – uma delas referente ao direito objetivo e outra ao direito subjetivo. O primeiro é o conjunto de normas obrigatórias, por exemplo, as do direito civil. No outro caso, quando se alude à capacidade de uma pessoa para determinar obrigatoriamente a conduta de outra, com a expressão "ter direito a (...)", trata-se de direito subjetivo.
O direito romano distingue os dois lados do direito. No conceito jus est norma agendi  está implícita a face objetiva do direito. A noção subjetiva se traduz na fórmula jus est facultas agendi . A ordem jurídica compõe-se do direito objetivo, ao reunir prescrições, normas, leis e imperativos jurídicos. O direito objetivo, ao voltar-se sobre situações concretas, gera direitos subjetivos e deveres jurídicos que se opõem ou se articulam reciprocamente.
O direito objetivo encerra o preceito e a sanção. Para tornar efetivo um seu direito subjetivo, no entanto, a pessoa pode invocar os órgãos públicos. A sanção entra, assim, em atividade para assegurar um direito subjetivo. Essa construção teórica não assegurava, em seu desdobramento lógico, o direito subjetivo contra o Poder Público. O direito subjetivo, até o século XIX, só se podia efetivar entre particulares. O direito público se reduzia a um tecido de normas objetivas, nas quais o poder de exigir uma prestação, entregue ao indivíduo, não seria mais do que um reflexo da regra geral e abstrata.
Duas etapas levaram à consagração do direito subjetivo contra o Estado. O reconhecimento da submissão do Poder Público ao direito foi o primeiro impulso, apoiado na doutrina da pessoa jurídica do Estado. O Estado seria uma pessoa jurídica, com as mesmas características da pessoa de direito privado, desdobrada em fisco e poder, sujeito o primeiro ao controle jurídico.
Um progressivo desenvolvimento da doutrina envolveu os dois membros artificiais do Estado em uma unidade, que não controla nem produz normas jurídicas, mas se subordina a essas normas. O direito passou a obrigar não só aos particulares, mas ao próprio Estado, limitado em suas manifestações políticas pela atividade jurídica. O Estado converteu-se, assim, no Estado de Direito.
A segunda etapa, decisiva para a fixação do direito subjetivo contra o Estado, deu-se por meio da universalização da democracia, no século XIX. O indivíduo, graças aos direitos políticos de participar na formação das decisões e dos órgãos públicos, não se reduzia mais a simples destinatário das ordens emanadas do Poder Público, mas se tornou participante da atividade do Estado e de sua organização. Essa mudança de rumo separou a "pessoa" do "Estado", em expressões autônomas e invioláveis, e essa separação marcou a fase do respeito aos direitos individuais, da liberdade e da faculdade de exigir do Poder Público uma conduta conforme ao direito.
Elementos do direito subjetivo: Os elementos que constituem o direito subjetivo se deduzem a partir de seu próprio conceito. É necessário que exista, em princípio, a presença de um sujeito, de um objeto e da relação que os liga. Sujeito é o ser a quem a ordem jurídica assegura poder de ação. O sujeito do direito é a pessoa natural ou jurídica. Todo homem é sujeito de direitos, inclusive o incapaz, cujo direito é exercido por um representante quando ele mesmo não pode atuar.
O objeto do direito é um bem de qualquer natureza, coisa corpórea, ou incorpórea, redutível a dinheiro ou não, sobre o qual recai o poder do sujeito. O objeto pode expressar-se e adquirir conteúdo na obrigação imposta a alguém de observar certa conduta ou de se abster de intervir na atividade do sujeito. A relação de direito é o vínculo que submete o objeto ao sujeito.
Os direitos subjetivos, como regra geral, situam-se em duas categorias: os direitos absolutos e os direitos relativos. Na categoria de direitos absolutos se incluem os direitos reais, ou seja, os direitos sobre as coisas. Os direitos relativos se fundam numa relação pessoal entre o sujeito e o indivíduo obrigado. A classificação em apenas duas categorias não se tornou consenso na doutrina e, como não se chegou a uma unidade de critérios, prevalece a dispersão empírica, que consagrou as diversas classes dos direitos subjetivos: públicos e privados; absolutos e relativos; patrimoniais e não patrimoniais; e principais e acessórios.
Direito positivo e direito natural: Direito positivo é o conjunto de normas jurídicas em vigor num determinado espaço. Desde Aristóteles, contudo, o adjetivo aposto ao substantivo direito caracteriza um direito fundado sobre a lei, ao contrário do direito calcado sobre a justiça. Nos séculos XVIII e XIX, o direito positivo foi identificado com o positivismo, para o qual o único direito válido é o direito positivo. O positivismo, tal como modernamente é entendido, procura separar o direito, em sua vigência concreta, do direito com referência a valores.
Em sentido lato, entende-se por direito natural o que busca fixar seu fundamento na natureza – a ordem natural do mundo físico se equipara à ordem natural das relações humanas –, que se mantém íntegra em todos os tempos e em todas as latitudes. Acima da vontade do legislador, além do direito objetivo, há uma ordem jurídica superior, que serve de roteiro e inspiração à lei e aos costumes. Criação da filosofia estóica, incorporou-se à ética cristã, de onde, com diversos conteúdos, projetou-se na Renascença, no Iluminismo e no mundo atual. Sua presença se verifica em muitas manifestações modernas, sobretudo nas expressões dos direitos individuais e nas liberdades públicas.
O direito natural, para os positivistas, não passa de uma ideologia, criada para adequar o direito às aspirações de uma época. A identificação entre natureza, razão e justiça leva a uma concepção fluida, não concretizável historicamente, nem capaz de se sobrepor ao tempo e ao espaço. Ela desloca o problema da validade do direito para uma esfera metajurídica, na qual permanece um resíduo teológico, que não resolve o impasse que está na raiz de todo o drama jurídico.
Estrutura do direito: O mundo jurídico moderno organiza o Estado com base na ordem constitucional. O chamado Estado de Direito se baseia, em sua formação e em seu desenvolvimento, sobre o constitucionalismo. A Constituição, escrita ou costumeira, flexível ou rígida, é a referência da ordem jurídica constitucional. A Constituição, no entanto, não se baseia em si mesma, mas numa norma ou decisão fundamental que lhe dá legitimidade. Assim, o fundamento da Constituição pode ser uma norma que não deriva de outra, de caráter superior, ou uma decisão política prévia, adotada por um poder ou autoridade previamente existente.
Para Max Weber, a definição e a caracterização da norma fundamental situam-se numa realidade extrajurídica. Na base de toda a arquitetura legal e constitucional está a aceitação de certas expressões históricas e políticas, ideologicamente revestidas do poder de organizar o Estado. De qualquer forma, as normas ou decisões fundamentais, prévias ou pressupostas à Constituição, não estão sujeitas ao controle das constituições. Elas têm o caráter de puro poder, que os monarcas, o povo ou as revoluções acionam, rompendo a legalidade preexistente.
A Constituição representa a base de toda a ordem do direito. A partir dela se disciplinam as relações sociais, dentro de uma estrutura homogênea, teoricamente liberta de contradições. A Constituição não coincide, entretanto, com a lei constitucional. Há princípios imanentes, que expressam, num plano global, o caráter da decisão política básica ou da norma fundamental, que serve de roteiro à interpretação das leis constitucionais, que são comandos enfeixados na própria Constituição.
Para o maior defensor dessa dualidade, Carl Schmitt, a Constituição é intocável, ao passo que as leis constitucionais podem ser reformadas ou suspensas. A determinação concreta dos dois campos não é clara. Suas fronteiras são fluidas, vagas e não raro feridas pelas mudanças históricas.
Fontes do direito: O termo "fonte", utilizado tradicionalmente pela doutrina em sentido metafórico, indica o ponto em que uma regra, emergindo da vida social, assume o caráter de norma jurídica. As fontes são de ordem formal, capazes de assumir expressão obrigatória, desprezadas as de ordem substancial ou real, que se referem aos fenômenos sociais, formados da substância do direito, tais como a necessidade pública, o interesse coletivo e as reivindicações sociais. Assim, fontes são os meios pelos quais se formam ou pelos quais se estabelecem as normas jurídicas.
Entre as várias classificações das fontes do direito, a mais importante é a que as divide em fontes imediatas ou diretas e fontes mediatas ou indiretas.
 A fonte imediata ou direta do direito é a lei. Há quem incorpore ao gênero o costume, dado seu caráter obrigatório. O consenso geral, todavia, inclui o costume na chave das fontes mediatas ou indiretas, ao lado da jurisprudência e da doutrina .No sistema jurídico brasileiro, os costumes atuam como fonte supletiva da lei. Há sistemas, no entanto, ainda impregnados pelo direito consuetudinário, nos quais se admite, embora cada vez menos, o costume que derroga a lei. Nos países anglo-saxões, onde ainda subsiste a commom law, o costume se impõe mesmo contra a lei, se houver reconhecimento judicial. Há, nessa tradição, uma fusão entre o costume e a fixação dos precedentes judiciais. Na doutrina, a admissão dos costumes contra legem constitui matéria polêmica, mesmo entre juristas nacionais.
O caráter supletivo do costume flui, entretanto, da tradição jurídica de Portugal e do Brasil. Fonte supletiva do direito privado, com particular relevo no direito comercial, o costume está excluído do direito penal, para o qual não há crime, nem pena, sem lei anterior que defina o crime e comine a pena.
Além disso, a própria autonomia dos compartimentos jurídicos está em constante mutação. Disciplinas novas se especializam do corpo geral, formando ramo próprio, de acordo com as exigências sociais. A flutuação das novas disciplinas corresponde à incerteza da classificação no campo público ou privado, sem que a delimitação dos setores suscite consequências juridicamente relevantes.


A compreensão do fenômeno jurídico passa além do estudo de um ordenamento positivado em um Estado determinado, o qual prescreve o conjunto das normas jurídicas a serem observadas, sob pena de aplicação das sanções prescritas, na hipótese de seu descumprimento.
O desenvolvimento de uma Teoria Geral do Direito teve por escopo inicial a própria afirmação da autonomia do Direito enquanto ciência. Não sem razão que a Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen[15], apresenta-se como a Teoria Geral do Direito de maior repercussão do século XX.
Pode-se entender isso a partir do próprio texto de Kelsen, em Teoria Pura do Direito, onde ele deixa claro que a moral no Direito existe, porém não faz parte da Ciência Jurídica; e também expõe o risco de se reconhecer o direito estatal como legitimado aprioristicamente. Essa última dá a entender uma preocupação com ideologias enraizadas fora do Estado, ou seja, o Estado é a segurança e o que está fora dele pode ser despótico.
Consta em Teoria Pura do Direito:
Assim como o caos das sensações só através do conhecimento ordenador da ciência se transforma em cosmos, isto é, em natureza como um sistema unitário, assim também a pluralidade das normas jurídicas gerais e individuais postas pelos órgãos jurídicos, isto é, o material dado à ciência do Direito, só através do conhecimento da ciência jurídica se transforma num sistema unitário isento de contradições, ou seja, numa ordem jurídica. Esta "produção", porém, tem um puro caráter teorético ou gnoseológico.
Observa-se um progressivo alargamento do objeto de estudo da Teoria Geral, consoante lição de Larenz[16]:
Anteriormente falava-se de uma “teoria geral do Direito” e entendia-se por tal uma doutrina acerca da estrutura lógica da norma jurídica, acerca de certos conceitos fundamentais que podem encontra-se em todos os ordenamentos jurídicos desenvolvidos, como por exemplo, “lícito e ilícito”, dever ser, ter a faculdade, poder, comando, proibição, permissão, sujeito jurídico e objeto de direitos) e sobre as relações lógicas destes conceitos fundamentais entre si e os modos de pensamento da Jurisprudência, sendo assim, no essencial, um traço de união entre a lógica e a Jurisprudência. Procurava-se neste campo chegar a conhecimentos respeitantes ao direito universalmente válido face a um determinado ordenamento jurídico “positivo”, e, em rigor, essencialmente mediante uma perspectiva normativa e que não suportassem o lastro prévio de pressupostos ontológicos ou metafísicos.

A Teoria Geral do Direito teve seu conteúdo dilatado de modo a incluir as novas descobertas das ciências sociais e os conhecimentos linguísticos-teoréticos e hermenêuticos.
 Deste modo, a moderna Teoria Geral do Direito trata da conceituação do Direito, da estrutura da norma jurídica e do ordenamento jurídico, da teoria das fontes do Direito, da interpretação das normas jurídicas e das técnicas de colmatação das lacunas supostamente observáveis no ordenamento jurídico, além da estrutura das relações jurídicas.
O Direito e a Moral não podem se distinguir essencialmente com referência à produção ou à aplicação de suas normas. Tal como as normas do Direito, também as da Moral são criadas pelo costume, por meio de uma elaboração consciente.
O Direito só pode ser distinguido essencialmente da Moral quando se concebe como uma ordem de coação, isto é, como uma ordem normativa, a qual procura obter uma determinada conduta humana, ligando a conduta oposta um ato de coerção socialmente organizado. Já a Moral é uma ordem social que não estatui qualquer sanção.
Embora as normas jurídicas, como prescrições de dever-ser, constituam valores, a tarefa da ciência jurídica não é de forma alguma uma valoração ou apreciação do seu objeto, mas uma descrição do mesmo, alheia a valores. O jurista científico não se identifica com qualquer valor, nem mesmo com o valor jurídico por ele descrito.
Se a ordem moral não prescreve a obediência à ordem jurídica em todas as circunstâncias e, portanto, existe a possibilidade de uma contradição entre a Moral e a Ordem Jurídica, então a exigência de separar o Direito da Moral e a Ciência Jurídica da Ética significa que a validade das normas jurídicas positivas não depende do fato de corresponderem à ordem moral, que, do ponto de vista de um conhecimento dirigido ao Direito positivo, uma norma jurídica pode ser considerada como válida, ainda que contrarie a ordem moral.
Segundo Paulo Nader[17], Direito e Moral são instrumentos para o controle social que não podem se excluir, mas sim se completar e influenciar-se mutuamente uma a outra, mesmo que cada um tenha seu objetivo próprio. É possível analisar-se a ação conjunta deste processo para que não seja colocado um abismo entre o Direito e a Moral. Não se pode vê-los como sistema autônomo sem comunicação. O Direito recebe valorosa substância da Moral. Eles se distinguem totalmente, mas jamais se separam.
A fim de esclarecer suas distinções, falar-se-á também da Grécia e de Roma, palco do nascimento da Filosofia do Direito, berço das maiores e mais profundas especulações sobre o espírito humano. Todavia, a opinião dos expositores desta matéria é que os gregos não chegaram a distinguir, na teoria e na prática, as duas ordens normativas. Aristóteles e Platão deixaram o pensamento "a concepção da Moralidade como ordem interna", o que não induz à convicção de que ambos chegaram a distinguir o Direito da Moral. Em seu dialogo, Platão considerou a justiça como virtude, e Aristóteles, apesar de atentar para o aspecto social da justiça, considerou-a dentro da mesma, como princípio de todas as virtudes.
 Segundo Miguel Reale[18], a teoria do mínimo ético, exposta pelo filosofo inglês Jeremias Bentham e depois desenvolvidas por vários autores, diz que o Direito é o mínimo da Moral, declarado obrigatório para que a sociedade possa sobreviver. Como nem todos podem ou querem realizar de maneira espontânea as obrigações morais, é indispensável armar de força certos preceitos éticos, para que a sociedade não soçobre. A Moral, em regra, dizem os adeptos desta doutrina, é cumprida de maneira espontânea, mas como as violações são inevitáveis, é indispensável que se impeça, com mais vigor e rigor, a transgressão dos dispositivos que a comunidade considerar indispensável à paz social.
Assim sendo, o Direito não é algo diverso da Moral, mas é uma parte desta, armada de garantias especificas. Miguel Reale[19] conclui que "tudo o que é jurídico é Moral, mas nem tudo o que é Moral é jurídico".
O cumprimento da sentença jurídica satisfaz o mundo jurídico, mas continua alheio ao campo propriamente moral. Com isso, pode-se indicar uma diferença básica: a Moral é incoercível e o Direito é coercível. Pode-se afirmar, portanto, que a distinção entre Direito e Moral está na coercibilidade, ou seja, a expressão técnica que mostra a plena compatibilidade que existe entre o Direito e a Moral é a força.
Pode-se ilustrar que Jhering[20] simbolizava a atividade jurídica como uma espada e uma balança: A justiça tem numa das mãos a balança, em que pesa o Direito, e na outra a espada, que se serve para o defender. A espada sem a balança é a força brutal; a balança sem a espada é a impotência do Direito.
A teoria da coação logrou larga adesão na época do predomínio positivista. Depois foi alvo de críticas irrespondíveis, a começar pela observação fundamental de que, via de regra, há o cumprimento espontâneo do Direito.
A coação é a verificação da compatibilidade do Direito com a força, o que dá lugar ao aparecimento da teoria da coercibilidade, segundo a qual o Direito é a ordenação coercível da conduta humana.
A teoria da coercibilidade revela a possibilidade de haver execuções jurídicas compulsórias sem que isso comprometa a juridicidade. Para garantir o respeito de seus preceitos, o Direito é totalmente coercível, pois permite adicionar força ao Estado.
A norma jurídica teria que ser adotada por adesão espontânea voluntária, mas há oposição ao cumprimento da norma, por isso faz-se necessário o uso da coação. Assim, a coação só é observada na hipótese da não efetividade do cumprimento legal. A Moral, porém, não precisa de elemento coativo. É incoercível, mas nem por isso a norma da Moral deixa de exercer certa intimidação, pois, para a sociedade, ela é valiosa e o não-cumprimento desta provoca reação por parte dos membros da sociedade. E essa intimidação exerce caráter punitivo e também intimidativo.

O Direito possui heteronomia, ou seja, sujeição ao querer alheio objetivo e transpessoal das normas jurídicas, às quais se opõe, acima das pretensões dos sujeitos de uma relação.
Segundo Miguel Reale[21], foi Kant o primeiro pensador a trazer à luz essa nota diferenciadora, afirmando ser a Moral autônoma e o direito heterônomo. Assim sendo, apenas cumpre-se o que terceiros abrigam a se cumprir. Há, então, um caráter de "alheidade" do indivíduo em relação à regra.
"Existe bilateralidade atributiva – escreve Miguel Reale[22] – quando duas ou mais pessoas estão numa relação segundo uma proporção objetiva que as autoriza a pretender ou a fazer garantidamente alguma coisa. Quando um fato social apresenta esse gênero de relação, dizemos que é jurídico".
Segundo esse autor, a diferença entre os fenômenos jurídicos e os não jurídicos é que nestes a bilateralidade não é atributiva, isto é, a correspondência não está assegurada, não obedece a um padrão uniforme ou obrigatório.
A bilateralidade atributiva é, pois, uma proporção intersubjetiva em função da qual os relacionados podem exigir, ou fazer garantidamente algo.
Sem relação que una duas ou mais pessoas não há Direito. Para que haja Direito é indispensável que a relação entre os sujeitos seja objetiva, isto é, insuscetível de ser reduzida, unilateralmente, a qualquer dos sujeitos da relação. Da proporção estabelecida deve resultar a atribuição garantida de uma pretensão ou ação, que se podem limitar aos sujeitos da relação ou estender-se a terceiros. Se o Direito se distingue da Moral, ele não é algo apartado da Moral; é a parte integrante desta armada de garantias específicas. Por isso, o Direito, sendo heterônomo, coercível, bilateral atributivo, é, igualmente, ordenação das relações de convivência, segundo uma integração de fatos e valores.
O Direito é, pois, "a ideologia que sanciona, é a linguagem normativa que instrumentaliza a ideologia do legislador ou a amolda às pressões contrárias, a fim de que sobreviva"[23].
O Direito garante o cumprimento social das normas e a Moral, com seus princípios e valores, regulamenta as relações mútuas. A relação entre a Moral e o Direito é historicamente mutável, muda quando muda historicamente o conteúdo de sua função social.
A História do Direito tem registrado uma constante disputa com a Moral, a visão ética da humanidade, as quais o homem encontraria naturalmente por meio da razão. O Direito positivado apenas cuidaria de tutelar os preceitos naturais da ética, individualizando-os objetivamente nas leis


7.1 A Doutrina da Justiça de Aristóteles
Aristóteles, na Ética tenta desenvolver a sua filosofia moral sobre uma base inteiramente racionalista, que não a desprovida de fortes implicações morais. Preocupa-se em apresentar sua metafísica, doutrina da essência das coisas, como uma ciência do ser. Todavia acrescenta que a ciência dos princípios e das causas iniciais é suprema, por ser ela a formadora do bem em cada caso particular: a essência do bem é o bem que deve ser feito, tendo como objetivo, em ultima instância, o conceito de Deus, que é ao mesmo tempo primeira causa e o último fim, isto é, o Bem absoluto.
A ideia Aristotélica de Deus envolve o pensamento sobre o móvel e o imóvel, sendo o móvel o domínio da natureza e, portanto, o objetivo da ciência, o objeto da metafísica, que Aristóteles expressa como teologia, onde esta é colocada como o conhecimento de Deus. A teologia para Aristóteles está acima das outras ciências, porque o seu objetivo é superior ao das outras ciências. Se há movimento, é porque existe algo que é movido, "homem", ou transformado, e algo que produz esse movimento, sendo este atribuído a Deus, o qual é imóvel, e ao mesmo tempo o Bem absoluto.
Então por ser Deus o Bem absoluto, é dele que vem o pensar, vindo a surgir a questão: Qual é o conteúdo do pensar? Ou, em outras palavras: Qual o conteúdo do Bem absoluto? A resposta de Aristóteles é que Deus é o pensar, ele pensa no que é mais preciso, sendo nele próprio ou no seu próprio pensar, equivalendo-se a uma tautologia vazia. O conteúdo do pensar é o pensar e do Bem é o Bem. Com isso, diz Aristóteles que Deus é o governante do mundo, implicando em uma teologia monoteísta, como tal uma ética metafísica, que faz pensar que o governo ideal é o de um só, pois o governo de muitos não é bom.
Esse é o objeto de sua metafísica enfatizando que o bem para o homem é o ser virtuoso, se a pessoa  virtuosa, isto , se o indivíduo se conduz como deve se conduzir, então será feliz, pois a verdadeira felicidade nada mais é do que a própria virtude. Se alguém acredita na afirmação desta filosofia moral, onde a virtude e apenas a virtude o tornarão feliz, então a consciência de ter se conduzido moralmente produz nele o sentimento de satisfação, que é equivalente ao bem, ou seja, o Bem absoluto.
Assim, o Bem, o valor moral, é humanizado, sendo apresentado como a virtude do homem. Consequentemente, a Ética de Aristóteles almeja um sistema de virtudes humanas, entre as quais a justiça, onde esta é a virtude perfeita. No início da Ética, Aristóteles enfatiza que "o mesmo pensamento, em ser exato, não deve ser esperado em todas as outras divisões filosóficas".
Na Ética, deve-se ficar satisfeito se a pessoa conseguir apresentar um pequeno esboço da verdade. Isso é mostrado por Aristóteles quando a pessoa entra em equilíbrio, ou seja, a doutrina do meio "mesótes". O excesso e a deficiência são marcas de vícios, e a observância do meio, uma marca de virtude. Para Aristóteles, os extremos são difíceis de alcançar, então o meio é a virtude que o homem deve procurar, pois nenhum pode se equipara ao Bem Supremo, ou, melhor dizendo, a Deus. Se a conduta do homem está em conformidade com as normas pressupostas como válidas, diz-se que ele é virtuoso obedecendo-as; caso contrário, ele viola as normas, atingindo um dos extremos, que é o mal.
A diferença aristotélica de três graus é uma realidade psíquica, dizendo que a virtude moral ocupa-se de sentimentos e ações nos quais se pode ter excesso, deficiência ou um justo meio. A doutrina da mesótes cria a aparência de que haveria uma única e mesma norma que é violada quando alguém permanece, por assim dizer, abaixo, ou vai além da linha determinada por ela.
Embora a Ética da doutrina da mesótes pretenda estabelecer, de modo decisivo, o valor moral, ela deixa para o direito positivo e a moral positiva exercerem tal função, os quais determinam o que é muito e o que é pouco, mau ou bom, estabelecendo, assim, o meio. Nessa justificação da ordem social estabelecida encontra-se a verdadeira função da tautologia revelada por uma análise critica da formula da mesótes.
A justiça na Ética de Aristóteles abrange o sentido geral e também o particular, sustentando dois conceitos que são a legitimidade e a igualdade. Olhando por esse ângulo, o temo injusto refere-se ao que viola a lei e ao que toma para si mais do que tem direito, vindo a ser o homem respeitador da lei e o imparcial, o homem justo. Significa que justiça é aquilo que é legitimo e igual ou imparcial, onde a injustiça parte para o desigual e o parcial. Quanto à relação de legitimidade e igualdade, o seu conceito não é idêntico, sendo a legitimidade um conceito mais amplo e a igualdade a virtude em sua essência.
A justiça trata da igualdade. Há a justiça distributiva e a corretiva. A distributiva é exercida na distribuição da honra, riqueza e outros bens divisíveis que cada um possui, independentemente se um tem mais ou menos que o outro. A justiça corretiva é a exercida pelo Estado, tanto no meio privado como no meio público, solucionando disputas ou corretivos a quem infligir as normas estabelecidas.
A justiça corretiva está dentro do direito positivo exercido pelo Estado. Como uma filosofia moral racionalista, não é capaz de determinar o conteúdo de uma ordem justa, quanto ao que é o bem ou mau, quem é igual ou o que é igual. Ela deve pressupor essa determinação, deixando-as para o Estado exercer o direito positivo. Por isso, a justiça é a virtude que dá a cada um o que lhe é devido.
A doutrina do direito natural busca soluções para definir o que é certo ou errado nas relações humanas. A base para essa definição fundamenta-se na suposição de que é possível fazer distinção entre a conduta humana natural e a antinatural, ou seja, aquilo que é natural, exigido pela natureza, e o que é contrário à natureza e proibido por ela.
A civilização humana, durante todo o decorrer do seu desenvolvimento, passou por etapas; no início, foi uma etapa inferior, onde a interpretação da natureza manifestava-se no animismo, acreditando que os animais, plantas, rios, estrelas possuem dentro ou atrás deles um espírito e que a natureza faz parte da sua sociedade. Esses espíritos possuiriam poder para prejudicá-lo e por isso deviam ser adorados. Na verdade, a base dessa interpretação é religiosa.
Já em uma etapa mais superior da evolução religiosa, o animismo é substituído pelo monoteísmo, ou seja, as coisas são criadas por Deus e acontecem por sua vontade. Se a doutrina do direito natural for coerente, assumirá um caráter religioso e como tal deduzirá regras justas, pois, na medida em que se explora a natureza, revela-se a vontade de Deus.
A doutrina do direito positivo e do direito natural, onde o natural, por ser de ordem divina, deve sobressair-se ao direito positivo, que é imperfeito, por ser criado pelo homem, o Direito positivo torna-se supérfluo, porém não descartado; pelo contrário, apesar de ser supérfluo é necessário, pois a natureza do homem conduz à necessidade de se estabelecer o Estado, ou seja, o direito positivo, ficando excluída a ideia de um conflito entre o direito positivo e o direito natural.
Ao se analisar as ideias de vários filósofos, nota-se que há uma divergência de pensamentos quanto à questão da doutrina o direito natural em relação a doutrina do direito positivo, exercida pelo Estado. Há uma busca constante em se provar qual das duas doutrinas tem maior valor e merece maior destaque.
Com isso, chega-se à conclusão de que ambas têm seu valor e a justiça, no ato de exercer a lei, deve utilizar-se de ambas as doutrinas para executar sua jurisprudência e não esquecer que as duas doutrinas têm seus apreços individuais e uma relação mútua entre si.
Essa investigação dos juízos de valor, que surge na ciência do direito, parece estabelecer os requisitos importantes para uma teoria geral do valor: o valor não é necessariamente uma relação com um interesse. O valor também pode constituir-se em uma relação com uma norma. Não tem nenhuma implicação metafísica.
Um juízo de valor, no sentido de enunciado essencialmente diferente de qualquer enunciado sobre a realidade, afirma uma relação entre um objeto e uma norma, cuja existência é pressuposta pela pessoa que emite o enunciado. O juízo de valor é, então, simultaneamente, um ato de valoração. Um valor é subjetivo se seu objeto é valorável apenas para os que estão interessados nesse objeto.
Um valor é objetivo se este for favorável a todos. Esse é o caso se a norma, que é padrão do valor, em sua existência e conteúdo, for determinada por fatos objetivamente verificáveis
 A razão de no presente estudo se apresentar e contrapor paradigmas dos Direitos dos Estados Liberal e Social , decorre da necessidade de se tomar por base as formações anteriores modelos paradigmáticos de Estados constitucionais para melhor compreender o novo paradigma exsurgente, ou seja, o do Estado Democrático de Direito, que, no Brasil, foi positivado e suposto pela Constituição da República de 1988.
Para compreender o real sentido de um paradigma e a forma pela qual ele foi introduzido na discussão epistemológica contemporânea, faz-se necessário uma análise, mesmo que breve, da concepção de paradigma construída por Thomas Kuhn[24].
No seu uso estabelecido, um paradigma, segundo Kuhn, é um modelo ou padrão aceito, que, na dimensão científica, raramente é suscetível de reprodução, porque, assim como decisões judiciais, o paradigma “é um objeto a ser mais bem articulado e precisado em condições novas ou mais rigorosas”[25].
Entende-se, portanto, que a cada mudança de paradigma há uma implicação necessária de que o passado seja re-trabalhado de forma a permitir que o novo paradigma seja visto como um implemento do anterior.
A noção de paradigma, segundo Menelick de Carvalho Netto[26], apresenta um duplo aspecto, haja vista que, por um lado, possibilita explicar o desenvolvimento científico como um processo de rupturas e/ou verifica mediante rupturas, por meio “da tematização e explicitação de aspectos centrais dos grandes esquemas gerais de pré-compreensões e visões-de-mundo”, consubstanciados no backgraund das práticas sociais, “que a um só tempo tornam possível a linguagem, a comunicação, e limitam ou condicionam o nosso agir e a nossa percepção de nós mesmos e do mundo”. Por outro lado, quanto ao outro aspecto, insta salientar que “também padece de óbvias simplificações, que só são válidas na medida em que permitem que se apresente essas grades seletivas gerais pressupostas nas visões de mundo prevalentes e tendencialmente hegemônicas em determinadas sociedades por certos períodos de tempo e em contextos determinados”.
Conceitualmente, de acordo com Kuhn[27], um paradigma pode ser entendido como “consenso científico enraizado quanto às teorias, modelos e métodos de compreensão do mundo”.  Ainda, na definição desse autor, eles são “realizações cientificas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência”[28].
Transportando a concepção de paradigma para o campo das ciências sociais, e dessa para o campo do direito, J. Habermas[29], citado por Marcelo Cattoni, entende que paradigmas de direito são “as visões exemplares de uma comunidade jurídica que considera como o mesmo sistema de direitos e princípios constitucionais podem ser realizados no contexto percebido de uma dada sociedade”. Com efeito, “um paradigma de direito delineia um modelo de sociedade contemporânea para explicar como direitos e princípios constitucionais devem ser concebidos e implementados para que cumpram naquele dado contexto as funções normativamente a eles atribuídas”[30].
O Estado Liberal de Direito, que teve algumas de suas bases teóricas lançadas por Locke[31] e Monstequieu[32], caracterizou-se pela difusão da ideia de direitos fundamentais, da separação de poderes, bem como do império das leis, próprias dos movimentos constitucionalistas que impulsionaram o mundo ocidental a partir da Magna Charta Libertatum de 1215.
Nesse paradigma – o do Estado Liberal – há uma divisão bem evidente entre o que é público, ligado às coisas do Estado direitos à comunidade estatal: cidadania, segurança jurídica, representação política, e o privado, mormente, a vida, a liberdade, a individualidade familiar, a propriedade, o mercado ,trabalho e emprego do capital. Essa separação dicotômica do público/privado  era garantida por intermédio do Estado, que, lançando mão do império das leis, garantia a certeza das relações sociais por meio do exercício estrito da legalidade.
Com a definição precisa do espaço privado e do espaço público, o indivíduo guiado pelo ideal da liberdade busca no espaço público a possibilidade de materializar as conquistas implementadas no âmbito do Estado, que assumiu a feição de não interventor.
Assim, sob a égide do paradigma liberal, compete ao Estado, por meio do direito posto, “garantir a certeza nas relações sociais, através da compatibilização dos interesses privados de cada um com o interesse de todos, mas deixar a felicidade ou a busca da felicidade nas mãos de cada indivíduo”, no dizer de Cattoni[33]. rompendo-se, via de consequência, com a anterior concepção de Estado [34], no qual, até a felicidade dos indivíduos era uma atribuição estatal.
Exsurgem idéias, como o exercício das liberdades individuais, de se poder fazer tudo que não for proibido em lei. Em contraposição à liberdade dos antigos, encarada como participação nas decisões políticas. abrolha-se a liberdade dos modernos, vista como autonomia da conduta individual (liberdade de ter)[35].
A igualdade de todos diante da lei é consagrada. Formalmente, todos são iguais perante a lei, ou “são iguais no sentido de todos se apresentarem agora como proprietários, no mínimo, de si próprios, e, assim, formalmente, todos devem ser iguais perante a lei, porque proprietários, sujeitos de direito, devendo-se pôr fim aos odiosos privilégios de nascimento”[36].
De modo geral, são consagrados os direitos de primeira geração, ou seja, na esfera privada, o movimento reflete no reconhecimento do que à época convencionou-se chamar de direitos naturais. Consagra-se a vida, a liberdade e a propriedade como valores máximos. Por outro lado, no âmbito da esfera pública, “convencionam-se direitos perante o Estado e direitos à comunidade estatal: status de membro nacionalidade, igualdade perante a lei, certeza e segurança jurídicas, tutela jurisdicional, segurança pública, direitos políticos”[37].
Uma vez detentora do controle político da sociedade, a burguesia não mais se interessa em manter, como apanágio de todos os homens, a prática universal dos princípios filosóficos de sua revolta social. Paulo Bonavides diz que “só de maneira formal os sustenta, uma vez que no plano de aplicação política eles se conservam, de fato, princípios constitutivos de uma ideologia de classe”[38].
Em outro momento, começa a detonação da primeira fase do constitucionalismo burguês, oportunidade em que as ideias avançam para uma participação total e indiscriminada do homem livre perante o Estado, na formação da própria vontade estatal. Essa ideia – democrática – se agita com ímpeto invencível, rumo ao sufrágio universal, no pensamento de Bonavides[39].
Decaída a autoridade do ancien régime e rompida a ideologia do passado, o homem caminha firme rumo à democracia, prosseguindo com seus combates e determinando a mudança ocorrida, no sentido das Cartas Constitucionais, cada vez mais exigentes de conteúdos que se destinassem a fazer valer objetivamente o ideário burguês das liberdades concretas, dignificadoras da pessoa humana[40].
O vitorioso Estado burguês de Direito eleva os direitos da liberdade ao cume da ordem política. Liberdade essa que é indispensável à manutenção do poder político e que, só nominalmente, estendia-se às demais classes.
Conforme impende Bonavides:
Disso não advinha para a burguesia dano algum, senão muita vantagem demagógica, dada a completa ausência de condições materiais que permitissem às massas transpor as restrições do sufrágio e, assim, concorrer ostensivamente, por via democrática, à formação da vontade estatal[41].

Ademais, permitia-se aos burgueses falar ilusoriamente em nome de toda a sociedade, com os direitos da liberdade fundamentais de primeira geração que ela mesma proclamara, os quais se apresentavam, em seu conjunto, do ponto de vista teórico, “válidos para toda a comunidade humana, embora, na realidade, tivesse bom número deles vigência tão-somente parcial, e em proveito da classe que efetivamente os podia fruir”.
A separação de poderes ganhou maior projeção como garantia contra o abuso do poder estatal, técnica fundamental de proteção dos direitos da liberdade, em razão do exercício fracionado e simultâneo das funções administrativas, legislativas e judiciais.
Além dos direitos da liberdade fundamentais e da separação de poderes, erige-se o ideal do law’s empire. Com observância estrita ao direito posto, garantiu-se ao indivíduo, além de outras prerrogativas, a segurança jurídica.
Nessa esteira de entendimento, Canotilho a define como uma “ordenação sistemática e racional da comunidade política através de um documento escrito no qual se declaram as liberdades e os direitos e se fixam os limites do poder político”[42].
Aos olhos de um cidadão revolucionário, a Constituição transporta necessariamente dois momentos essenciais, quais sejam: o da ruptura com a ordem histórico-natural em que se encontravam as coisas no antigo regime e o construtivista ,por ter sido elaborada por um novo poder – o Poder Constituinte – que define os esquemas e projetos de uma nova ordem racionalmente construída[43].
A Constituição é compreendida como instrumento de governo (instrument of goverment), “como estatuto jurídico-político fundamental da organização da sociedade política, do Estado”, no qual o poder político encontra limites e o Estado se juridifica, legitimado pelo Direito e pela representação popular. De Estado de Direito erige-se à condição de Estado Constitucional[44].
Ao Poder Judiciário, por sua vez, cabe dirimir conflitos interparticulares ou, “conforme o modelo constitucional, entre esses e a Administração Pública, quando provocado, através dos procedimentos devidos, aplicando o direito material vigente de modo estrito” por intermédio de processos lógico-dedutivos de subsunção do fato à norma, “sob os ditames da igualdade formal, estando sempre vinculados ao sentido literal”[45], numa evidenciada posição subalterna perante o poder a que competia a produção normativa, pois o Poder Judiciário ficava limitado a uma atividade mecânica,  ou seja, em ser apenas, no dizer de Montesquieu, la bouche de la loi, no dizer de Maulaz[46].
Por fim, ao Poder Executivo incumbe a tarefa de implementar o Direito, “garantindo a certeza e a segurança jurídicas e sociais, internas e externas, na paz e na guerra”[47].
De fato, a relação entre os três poderes pautou-se por um sistema de contenção, de freios e contrapesos, no qual o poder limitava o poder, no exercício das faculdades de impedir[48].
Resumindo, o paradigma do Estado liberal de direito importa na liberdade de todos, ou seja, todos devem ser livres, proprietários e iguais, num sistema alicerçado no império das leis, na separação de poderes e no enunciado dos direitos e garantias individuais. O direito, nesse paradigma, é visto como um sistema normativo no qual as regras, gerais e abstratas são válidas universalmente para todos os membros da sociedade.
A vivência das ideias abstratas que conformavam o paradigma do Estado liberal de direito, principalmente o exercício das liberdades e igualdades formais, bem como a propriedade privada, culminou por fundamentar ideias e práticas sociais no período que ficou caracterizado na história como de maior exploração do homem pelo homem.
A ordem liberal é posta em xeque, com o surgimento de ideias socialistas, comunistas e anarquistas, que a um só tempo, conforme Menelick, “animam os movimentos coletivos de massa cada vez mais significativos e neles reforça com a luta pelos direitos coletivos e sociais”[49].
Nesse momento da história do liberalismo, seu movimento e sistemas, de acordo com Lucas Verdú, sofreram “diversas transformações à medida que conectaram com outros movimentos ou reformaram seu quadro institucional para se ajustar a novas exigências sociais”[50].
Com o desenvolvimento do movimento democrático e o surgimento de um capitalismo monopolista, o aumento das demandas sociais e políticas, além da Primeira Guerra Mundial, surge a crise da sociedade liberal, possibilitando o aparecimento de uma nova fase do constitucionalismo – agora social –, com alicerce na Constituição da República de Weimar, e, em razão disso, inaugura-se o paradigma constitucional do Estado social de direito.
Esse novo paradigma que exsurge, o do Estado social, implica a materialização dos direitos anteriormente formais. Não se trata de acrescer uma gama de direitos de 2a geração direitos coletivos e sociais aos de 1a geração direitos individuais[51], que já existiam no paradigma do Estado liberal, pois o novo traz em seu bojo a necessidade de se realizar uma releitura historizada dos primeiros direitos chamados fundamentais, que os adapte à novel demanda social.
Dessa forma, a liberdade do Estado liberal não pode mais ser considerada como desdobramento da legalidade estrita, na qual o indivíduo podia fazer tudo o que não fosse proibido por lei, ...“mas agora pressupõe precisamente toda uma plêiade de leis sociais e coletivas que possibilitem, no mínimo, o reconhecimento das diferenças materiais e o tratamento privilegiado do lado social ou economicamente mais fraco da relação”[52], de modo a satisfazer um mínimo material de igualdade. Em outras palavras, a nova pauta inaugurada pelo paradigma do Estado social implica a “internalização na legislação de uma igualdade não mais apenas formal, mas tendencialmente material”. Na verdade, com a ruptura do paradigma do Estado liberal, ocorre uma redefinição dos clássicos direitos de 1a geração, ou, como diz Habermas, uma materialização do direito.[53]
Em razão da complexificação da sociedade, resultante no modelo paradigmático social ou de bem-estar-social, no qual o direito é materializado, o Estado vivencia um momento de ampliação extraordinária na sua seara de atuação, mormente pela necessidade de abranger tarefas vinculadas aos novos fins econômicos e sociais que lhes são atribuídos, e, via de consequência, reduzir a distância entre a realidade do senhor e do escravo à luz de uma igualdade material.
Nesse novo paradigma, o antigo cidadão-proprietário do Estado liberal é encarado como o cliente de uma Administração Pública garantidora de bens e serviços.
Com efeito, ao Poder Executivo são atribuídos novos mecanismos jurídicos e legislativos “de intervenção direta e imediata na economia e na sociedade civil, em nome do interesse coletivo, público, social ou nacional”.[54] Ao Poder Legislativo, por sua vez, além de sua atividade típica, compete o exercício de funções de controle, ou seja, “fiscalização e apreciação da atividade da Administração Pública e da atuação econômica do Estado”[55].
 Por outro lado, o “direito passa a ser interpretado como sistema de regras e de princípios otimizáveis, consubstanciadores de valores fundamentais ordem material de valores, como entendeu a Corte Constitucional Federal alemã, bem como de programas e fins, realizáveis no limite do possível”[56].
Agora, exige-se que o juiz seja la bouche du droit, pois a hermenêutica jurídica estabelece métodos mais sofisticados, como a análise teleológica, a sistêmica e a histórica:
(...) capazes de emancipar o sentido da lei da vontade subjetiva do legislador na direção da vontade objetiva da própria lei, profundamente inserida nas diretrizes de materialização do direito que mesma prefigura, mergulhada na dinâmica das necessidades dos programas e tarefas sociais[57].

Do Poder Judiciário exige-se uma aplicação construtiva do direito material vigente, de modo a alcançar seus fins últimos na perspectiva do ordenamento jurídico positivo. No paradigma do Estado social, cabe ao juiz, no exercício da função jurisdicional, “uma tarefa densificadora e concretizadora do direito, a fim de se garantir, sob o princípio da igualdade materializada, a Justiça no caso concreto”[58].

O Estado social, na verdade, representa uma transformação efetiva da superestrutura do Estado liberal.
Quando coagido pela pressão das massas, confere os direitos do trabalho, da previdência, da educação, intervém na economia como distribuidor, dita o salário, manipula a moeda, regula os preços, etc.. Em suma, estende sua influência a quase todos os domínios que dantes pertenciam, em grande parte, à área de iniciativa individual. Dessa forma, o Estado pode ser chamado de social[59].
Não obstante, ele conserva a adesão anteriormente existente à ordem capitalista, princípio ao qual não abdica, pois, no ocidente, o poder político repousa na estrutura econômica do capitalismo.
Por outro lado, no oriente socialista, a base estatal se transforma, “e é essa modificação que justifica o corte dicotômico entre o sistema político marxista e o sistema político ocidental”[60].
A própria liberdade política, a liberdade individualista da Declaração de Direitos do Homem não encontrou perdão por parte dessa nova doutrina. A pura liberdade de direito, proteção metafísica e morta, que deixava o fraco à mercê dos fortes, exatamente como a igualdade de direito, não servia aos teóricos do Estado socialista. Dessa forma, a liberdade e a igualdade formais foram completamente repensadas, “não mais no plano enganador da pura política, mas no plano social, para dar-lhes enfim um conteúdo real”[61].
Com efeito, apresentando um plus ao Estado social e mostrando-se no polo oposto ao modelo liberal/burguês, o arquétipo socialista se caracteriza na medida em que o Estado produtor remove o Estado de base capitalista, ampliando-lhe a esfera de ação, alargando o número das empresas sob seu poder e controle, suprimindo ou estorvando a iniciativa privada, colocando em xeque o modelo econômico estatal iniciado com o paradigma do Estado liberal de direito, no entender de Paulo Bonavides[62].
O Estado socialista, aproveitando a estrutura do modelo social, vai além à sua constituição e, passando a negar os valores capitalistas – aceitos pelo modelo social –, culmina por promover ampla ruptura com o modelo de Estado liberal, postando-se, após amplo intervalo, lado oposto ao modelo criado a partir dos movimentos liberais burgueses.
Ao final da Segunda Guerra Mundial, o paradigma do Estado social começa a ser questionado em razão de suas crises de legitimação[63]. Na década de 70, do século passado, as crises deste modelo estatal se manifestaram em toda a sua dimensão.
O Estado interventor se transforma em empresa e “as sociedades hipercomplexas da era da informação ou pós-industrial comportam relações extremamente intrincadas e fluidas”. Na esteira dos novos movimentos sociais hippie, estudantil, pacifista, ecologista que eclodem na década de 60, o paradigma do Estado democrático de direito exsurge configurando uma alternativa ao modelo de Estado do bem-estar-social[64].
Com o novo paradigma, são consagrados os direitos de 3a geração direitos ou interesses difusos e os de 1a e 2a, outrora consagrados nos paradigmas anteriores, passam por um processo de releitura de adequação ao novo modelo.
É que em decorrência do esgotamento do paradigma do Estado social, vieram à tona problemas relevantes, e as tentativas de superar a oposição existente entre Estado social e o direito formal burguês criaram uma nova compreensão do modelo constitucional de Estado, na qual, todos os atores envolvidos ou afetados têm que imaginar como o conteúdo normativo do novo arquétipo “pode ser explorado efetivamente no horizonte de tendências e estruturas sociais dadas”[65].
Nessa perspectiva, salienta Menelick de Carvalho Netto, os direitos de 1a geração são retomados como direitos de participação no debate público, e revestidos de conotação processual, informam a soberania do paradigma constitucional do Estado democrático de direito, “e seu direito participativo, pluralista e aberto”[66].
Da mesma forma, o Princípio da Separação de Poderes ganha uma nova roupagem, na qual o Poder Judiciário amplia sua participação no processo de concretização do Estado Democrático de Direito, haja vista que a ele compete viabilizar a promoção da legitimação do Estado democrático pelo procedimento da cidadania.
Exige-se um incremento quanto à postura do Juiz diante do texto normativo, bem como do caso concreto e “dos elementos fáticos que são igualmente interpretados e que, na realidade, integram necessariamente o processo de densificação normativa ou de aplicação do direito”, como resultado da aplicação das doutrinas de Konrad Hesse, Robert Alexy, Friedrich Müller, Ronald Dworkin, J.J. Canotilho e Paulo Bonavides, dentre vários outros[67].
Nessa perspectiva, reconstrói-se a relação entre direito e moral, outrora destruída pelo positivismo kelseneano. No nível de fundamentação pós-metafísico, pondera Habermas[68], tanto as regras morais quanto as jurídicas se diferenciam da eticidade tradicional, oportunidade em que se postam como normas de ação,  que surgem lado a lado, antes se completando do que se excluindo.
Segundo Maulaz, na fase pós-positiva inaugurada no paradigma do Estado democrático de direito, os princípios[69] ganham uma nova classificação que visa, sobretudo, permitir encontrar para as demandas complexas uma solução de compromisso do Direito à luz das exigências do novo arquétipo estatal. Todo caso posto em discussão diante do Poder Judiciário é um caso difícil. Para solvê-lo, portanto, dos operadores do direito, principalmente do Juiz, passa-se a exigir os atributos de Hércules, na ideia de Dworkin[70].
Guerra Filho, considerando o atual contexto social com a elevada complexidade e inovações da sociedade, diz que:
(...) não se pode ter ilusões quanto ao que esperar do texto, que é a Constituição, em seu sentido estritamente jurídico, que não pode ser visto como portador de soluções prontas para problemas dessa ordem. Seu texto é como uma obra aberta; ao ser interpretado, atribui-se-lhe a significação requerida no presente, levando em conta a Constituição em seu sentido empírico[71].

A essa altura da revolução científica não se mostra mais viável a tese formalista/normativista de interpretação do direito construída por Hans Kelsen[72], que preconiza o esgotamento das possibilidades de soluções complexas por meio da produção normativa, pois, por melhor que se apresente, a moldura normativa sempre deixará margem à atuação do intérprete. No paradigma do Estado democrático de direito, antes de boas leis, devem existir bons operadores do direito.
Nesse diapasão, requer-se do Poder Judiciário – no paradigma constitucional do Estado democrático de direito – decisões que, no dizer de Menelick:
(...) ao retrabalharem construtivamente os princípios e regras construtivos do Direito vigente, satisfaçam, a um só tempo, a exigência de dar curso e reforçar a crença tanto na legalidade, entendida como segurança jurídica, como certeza do direito, quanto ao sentimento de justiça realizada, que deflui da adequabilidade da decisão às particularidades do caso concreto[73].

Entretanto, é preciso que o julgador tome ciência da transformação estrutural ocorrida no ordenamento jurídico. Diferentemente da sua formação positivista, consistente num mero conjunto hierarquizado de regras aplicáveis à base do tudo ou nada, na idade pós-positiva consagrou-se uma superestrutura normativa, na qual as regras e os princípios se mostram como espécies normativas, muito embora não apresentem tal estrutura.
Nessa nova estrutura jurídica que considera o princípio como uma espécie normativa, ela reúne as funções de condicionar a leitura das regras, contextualizá-las, inter-relacioná-las, tornando possível a integração construtiva da decisão adequada de um hard case, em virtude da impossibilidade de serem resolvidos, de forma satisfatória, apenas com o emprego das regras jurídicas (rules)[74].
Com efeito, pondera Menelick de Carvalho Netto[75], ao condicionarem a leitura das regras, suas contextualizações e inter-relações, e, ao possibilitarem a integração construtiva da decisão adequada de um hard case, os princípios operam ativamente no ordenamento jurídico positivo.
Frise-se que é de suma importância, na atualidade, desenvolver uma teoria da ciência jurídica adequada e atualizada aos parâmetros do paradigma constitucional do Estado Democrático de Direito, por meio da qual se atribua a determinadas normas consagradoras de direitos fundamentais a natureza de um princípio[76], de forma que, nos casos difíceis, os tribunais decidam em conformidade com a demanda valorativa princípiológica.
Os julgamentos dos juízes que decidem um caso atual devem levar em conta o horizonte de um futuro presente, fincados na validade à luz de regras e princípios legítimos, uma vez que as decisões judiciais, do mesmo modo que as leis, são criaturas da história e da moral[77]. Pretende-se, de um lado, a obtenção de índices satisfatórios de segurança jurídica e, de outro, a pretensão cinge-se à legitimidade da ordem jurídica.
A demanda do paradigma democrático implica na construção do direito à luz da compreensão comum e moral do justo, sem abrir mão do ideal da segurança nas relações jurídicas intrincadas.
Com efeito, a teoria adequada ao Estado Democrático de Direito é resultante da aproximação da prática interpretativa de textos constitucionais exercida na jurisdição constitucional[78], com a inserção de princípios nos textos das Constituições modernas, convertendo-os em pautas valorativas, norteadoras e legitimantes, com hegemonia sobre as demais fontes normativas.
O ordenamento jurídico, na vertente pós-positiva, mostra-se como um conjunto normativo entrelaçado em diferentes graus, de regras e princípios, concretizadores de uma ideia-retora, que, segundo Guerra Filho:
(...) de um ponto de vista filosófico, metapositivo, pode ser entendida como a ideia do direito (Rechtsidee), fórmula sintetizadora das ideias de paz jurídica e justiça, mas que, para nós, se condensa positivamente na fórmula política adotada em nossa Constituição: Estado Democrático de Direito[79].

Na esteira do pensamento de Dworkin, conclui-se que dado ao grau de abstração, os princípios, ao contrário das regras, podem ser contrários (tensão) sem serem contraditórios (antinômicos) – o que equivale dizer que eles não se eliminam reciprocamente à base do tudo ou nada.
Nessa relação de contrariedade sem contraditoriedade, existe um intervalo conceitual no qual se permite a construção, pelo operador do direito, de soluções adequadas à demanda complexa.
Assim, é viável afirmar que no ordenamento jurídico subsistem:
(...) princípios contrários que estão sempre em concorrência entre si para reger uma determinada situação. A sensibilidade do juiz para as especificidades do caso concreto que tem diante de si é fundamental, portanto, para que possa encontrar a norma adequada a produzir justiça naquela situação específica[80].

Precisamente, pondera Menelick de Carvalho Netto[81], é:
A diferença entre os discursos legislativos de justificação, regidos pelas exigências de universalidade e abstração, e os discursos judiciais e executivos de aplicação, regidos pelas exigências de respeito às especificidades e à concretude de cada caso, ao densificarem as normas gerais e abstratas na produção das normas individuais e concretas, que fornece o substrato do que Klaus Günther[82] denomina senso de adequabilidade, que,  no Estado Democrático de Direito, é de se exigir do concretizador do ordenamento ao tomar suas decisões.

Os paradigmas constitucionais do Estado Liberal e do Estado Social de Direito não se mostraram suficientes como modelos à satisfação dos interesses e valores que informam a sociedade na era da comunicação.
Se de um lado o modelo liberal consagra apenas liberdades formais, deixando ao cidadão o jugo da servidão, de outro, o modelo social se mostra inadequado, mormente pela fragilidade de sua política assistencialista e dispendiosa de redução das desigualdades.
Na idade da comunicação, o discurso legitimante da cidadania deve partir da sociedade e ecoar no âmbito do Poder Judiciário, que é de fundamental importância para a concretização dos ideais democráticos, tendo em vista o mecanismo e o poder decisório concentrado em suas mãos.
Ao juiz devem-se conferir poderes hercúleos para a satisfatória entrega da prestação da tutela jurisdicional no Estado Democrático de Direito visando, segundo guerra Filho:
A harmonização de interesses que se situam em três esferas fundamentais: pública, ocupada pelo Estado, a privada, que se situa o indivíduo, e um segmento intermediário, a esfera coletiva, na qual há os interesses de indivíduos enquanto membros de determinados grupos formados para a consecução de objetivos econômicos, políticos, culturais ou outros[83].

Se após a falência do Estado liberal num primeiro momento, observou-se o prestígio do modelo social, ou mesmo socialista de Estado, a “fórmula do Estado Democrático firma-se a partir de uma revalorização dos clássicos direitos individuais de liberdade”[84].
Nessa nova demanda democrática de valorização dos direitos fundamentais, os princípios são considerados espécies normativas diferentes das regras, proporcionando a busca de soluções de compromisso para os casos difíceis.
É que, ao preço de produzirem injustiças que subvertem a crença na própria juridicidade, na Constituição e no ordenamento, os princípios não podem, em nenhum caso, ganhar aplicação de regras[85].
A sociedade complexa exige a saída do legalismo estrito para a utilização efetiva de um Direito que seja, sobretudo, legítimo, no qual:
(...) a fundamentação moral e política dos princípios jurídicos, isto é, a legitimidade do Direito e a sua procedimentalização acham-se intimamente relacionadas, já que seus valores legitimadores não se encontrariam propriamente no conteúdo de suas normas, mas sim nos procedimentos,[86] que fundamentam algum de seus possíveis conteúdos[87].

Saliente-se que o direito no verdadeiro Estado de Direito (Estado Democrático de Direito), conforme já se mencionou, precisa ser, antes de tudo, legítimo, e para tanto faz-se necessário lançar mão das teses de superação ao positivismo. Legitimidade que pressupõe a legalidade, corolários de um efetivo Estado Democrático de Direito.
Conforme Marcelo Cattoni[88]:
Não há de modo algum, que isentar os operadores jurídicos de responsabilidades na realização do projeto constitucional-democrático entre nós. Uma ordem constitucional como a brasileira de 1988, que cobra reflexividade, nos termos do paradigma do Estado Democrático de Direito.

Ordena-se aos operadores do direito uma maior consciência hermenêutica, bem como, “responsabilidade ética e política para sua implementação – algo que, infelizmente, e muitas vezes, falta a doutrinadores e a tribunais no Brasil”.
No diapasão de Friedrich Müller[89], um verdadeiro Estado Democrático de Direito, “que possa ser chamado legítimo, só pode coexistir com um pensamento constitucional normativo (e de modo algum com um pensamento constitucional nominalista ou simbólico)”.


 O desenvolvimento de uma Teoria Geral do Direito teve por escopo inicial a própria afirmação da autonomia do Direito enquanto ciência. Não sem razão que a Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen, apresenta-se como a Teoria Geral do Direito de maior repercussão do século XX.
A ciência, sob o influxo do pensamento positivista, identifica-se com a busca pela exatidão e pelo rigor na definição de seus objetos e métodos. Revestiria a condição de conhecimento científico apenas aquilo que pudesse ser comprovado empiricamente, com objetividade e pureza conceitual.
Na tentativa de conferir um caráter científico ao Direito, Kelsen delineou uma Teoria Geral pautada na neutralidade axiológica, identificando a norma jurídica como sendo o objeto da ciência do Direito. Toda e qualquer consideração de ordem valorativa ou sociológica deveria ser extirpada do conteúdo do Direito, como forma de imprimir-lhe caráter científico. A norma jurídica  e o ordenamento jurídico identificar-se-iam de forma perfeita com o Direito, não havendo distinções entre estes. Posteriormente, Kelsen veio a retificar este pensamento, estabelecendo distinções entre a norma jurídica e a regra de Direito.
A teoria pura constituiu, assim, um movimento de purificação do Direito para livrá-lo de elementos metajurídicos. Kelsen concebeu a norma jurídica como entidade lógico-hipotética, capaz de qualificar ou constituir a experiência social sob o prisma jurídico.
Para a teoria pura, a ciência jurídica é uma ciência do dever-ser, de natureza puramente normativa. A norma seria indicativa e de estrutura hipotética, pois ligaria um fato condicionante a uma consequência, sem a formulação de juízos de valor moral ou político.
Kelsen estabeleceu a distinção entre proposições normativas e normas jurídicas. A proposição jurídica atende a uma função do conhecimento jurídico, na medida em que constitui um enunciado do qual é extraída a norma jurídica. Constitui, portanto, um juízo hipotético. As normas jurídicas, por sua vez, não representam juízos, constituindo mandamentos, comandos, imperativos, permissões e atribuições de poder ou competência. Elas têm função de autoridade, de produzir o Direito.
As proposições normativas formuladas pela ciência jurídica descrevem o Direito, não atribuindo direitos ou deveres. Como enunciados, podem ser verdadeiras ou falsas. A proposição normativa constitui a linguagem que descreve a norma jurídica. As normas jurídicas são normas de dever-ser, estabelecidas pela autoridade jurídica e, como tais, podem ser válidas ou inválidas.
O enquadramento das normas jurídicas dentro do ordenamento ocorre por critérios formais, independente de seu conteúdo. O ordenamento jurídico é um sistema de normas logicamente escalonadas segundo um sistema hierárquico no qual cada norma retira o seu fundamento de validade da norma que a precede. As normas são ordenadas de forma sequencial até atingirem o ápice da pirâmide, constituído pela norma hipotética fundamental. A norma hipotética fundamental é exigência da razão e constitui-se em pressuposto da cientificidade do Direito, na medida em que delimita o sistema, não permitindo o recurso a fundamentos de validade metajurídicos para a norma.
A ciência do Direito apresenta-se como uma ciência meramente descritiva, que se ocupa da descrição das normas hierarquicamente estabelecidas como ordem jurídica, sobretudo do ponto de vista de sua estrutura lógica. As normas jurídicas têm a configuração de um duplo juízo hipotético, o qual é composto por uma norma primária e uma norma secundária. Estas normas exprimem o dever jurídico em face de determinada situação de fato, e a sanção aplicável quando este é descumprido.
Kelsen substituiu a lógica aristotélica do ser pela lógica kantiana do dever-ser. Dessa sorte, ele substituiu a teoria da norma como imperativo para identificá-la como juízo hipotético. O conectivo “dever-ser” passa a expressar uma relação de imputação e não de causalidade. O juízo hipotético liga um “fato condicionante a uma conseqüência condicionada”.
As duas notas essenciais da juridicidade do Direito, para Kelsen, são a imputação e a coerção. Aquela porque separa o mundo jurídico do mundo natural, e esta porque constitui traço distintivo do Direito, em relação a outras espécies de normas.
Kelsen identifica, ainda, o Direito com o Estado. O Estado é o Direito subjetivado: a própria personificação da ordem jurídica. O Direito é o próprio Direito positivo estatal, na medida em que a soberania é a única fonte de criação do Direito. Esta identificação atua como um requisito para a autonomia do Direito, na medida em que afasta qualquer fundamentação legitimadora baseada no Direito Natural. A eliminação do dualismo entre Direito e Estado também conduz a outra conseqüência: o desenvolvimento de uma Teoria do Estado dentro da Teoria do Direito. Em sua Teoria do Estado, Hans Kelsen postula a unidade entre os Diretos nacional e internacional, afirmando o propósito de criar uma Teoria do Direito de caráter universal.
O fato de a Teoria Pura constituir uma tese essencialmente formal, que se importa com a estrutura e não com o conteúdo da norma, originou uma polêmica sobre uma possível tendência da teoria para os regimes autoritários.
Desse modo, a moderna Teoria Geral do Direito trata da conceituação do Direito, da estrutura da norma jurídica e do ordenamento jurídico, da teoria das fontes do Direito, da interpretação das normas jurídicas e das técnicas de colmatação das lacunas supostamente observáveis no ordenamento jurídico, além da estrutura das relações jurídicas.

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[1] LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 3. ed. Lisboa. Fundação Calouste Gulbenkian,  265.
[2] HELLER, Hermann. Teoria do estado. São Paulo: Mestre-Jou, 1968, p. 229.
[3] MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia alemã (Feuerback). Rio de Janeiro: Zahar, 1965.

[4] MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia alemã (Feuerback). Rio de Janeiro: Zahar, 1965, p. 65.
[5] AGUIAR, Roberto A. R. Direito, poder e opressão. São Paulo: Alfa-Ômega, 1980, XVIII.
[6] CASTRO, Celso A. P. Sociologia do direito. São Paulo: Atlas, 1985, p. 230.
[7] AGUIAR, Roberto A. R. Direito, poder e opressão. São Paulo: Alfa-Ômega, 1980, p. 79.
[8] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 387-397.
[9] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
[10] REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 1985.
[11] GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. 19. ed. rev. Rio de Janeiro: Forense, 1996.
[12] AGUIAR, Roberto A. R. Direito, poder e opressão. São Paulo: Alfa-Ômega, 1980, p. 79.
[13] MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O espírito das leis. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
[14] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
[15] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
[16] LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997.
[17] NADER, Paulo. Introdução ao estudo do direito. 17. ed. Rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 1999.


[18] REALE, MIGUEL. Lições preliminares do direito. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.
[19] Ibidem.
[20] JHERING, Rudolf Von. Der Kampf ums Recht. Vortrag, Wien, 1872 (Tradução: A luta pelo direito).
[21] REALE, Miguel. Lições preliminares do direito. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.
[22] Ibidem.
[23] AGUIAR, Roberto A. R. Direito, poder e opressão. São Paulo: Alfa-Ômega, 1980, p. 79.
[24] KUHN, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 2000. p. 43 et seq.
[25] Id. op. cit., p. 44.
[26] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 476, mai., 1999.
[27] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra: Almedina, 1999. p. 15. et seq. Cf. CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 52.
[28] KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 2000. p. 43 et seq, 217-232. Cf. CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 52. Cf. CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 475, maio. 1999. Cf. REALE, Giovanni. Para uma nova interpretação de Platão. São Paulo: Loyola, 1991. p. 7-10. Apud., CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 53-54).
[29] HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre a facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Universitário, 1997. p. 123 et seq.
[30] HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms: contributions to discourse theory of law and democracy. Cambridge: The MIT,  1996. p. 194-195. Apud., CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 54.
[31] LOCKE, John. Dois tratados sobre o governo civil. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
[32] MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O espírito das leis. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
[33] CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 55.
[34] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 477, maio, 1999.
[35] MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. Coimbra: Coimbra, 1997. tomo I, p. 53.
[36] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 478, maio, 1999.
[37] CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 55.
[38] BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 42.
[39] Id. op. cit., p 43.
[40] BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 44.
[41] Ibidem.
[42] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1999. p. 48.
[43] Ibidem.
[44] CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 55.
[45] Ibidem.
[46] MAULAZ, Ralph Batista de. Estado de Direito: discussão a partir da formação do Estado moderno e do direito contemporâneo. Franca: Faculdade de Direito, 2001. p. 170. Dissertação (Mestrado em Direito) – UNIFRAN, 2001. 194p. Cf. também GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria da ciência jurídica. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 162.
[47] CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 57.
[48] Ibidem.
[49] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 478, maio, 1999.
[50] LUCAS VERDÚ, Pablo. Curso de derecho politico. Madrid: Tecnos, 1992. v.1. p. 226. Apud., BARACHO JÚNIOR, José Alfredo de Oliveira. Responsabilidade civil por dano ao meio ambiente. Belo Horizonte: Del Rey, 2000. p. 55.
[51] CARVALHO NETTO, Menelick de, op. cit., p. 480.
[52] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 480, mai., 1999.
[53] HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre a facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. v. 2. p. 127 et seq. No mesmo diapasão, Menelick de Carvalho Netto pondera que os direitos individuais de 1a geração não são mais vistos como verdades matemáticas. “O direito privado, assim como o público, apresentam-se agora como meras convenções e a distinção entre eles é meramente didática e não mais ontológica. A propriedade privada, quando admitida, o é como um mecanismo de incentivo à produtividade e operosidade sociais, não mais em termos absolutos, mas condicionada ao seu uso, à sua função social. Assim, todo o Direito é público, imposição de um Estado colocado acima da sociedade, uma sociedade amorfa, carente de acesso à saúde ou à educação, massa pronta a ser moldada pelo Leviatã onisciente sobre o qual recai essa imensa tarefa. O Estado subsume toda a dimensão do público e tem que prover os serviços interentes aos direitos de 2a geração à sociedade, como saúde, educação, previdência, mediante os quais alicia clientelas”. (CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 480, mai., 1999).
[54] CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 60.
[55] Ibidem.
[56] Id. op. cit., p. 59.
[57] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 481, maio, 1999.
[58] CATTONI, Marcelo. Direito constitucional, op. cit., p. 61.
[59] BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 186.
[60] Id. op. cit., p. 184.
[61] CHEVALLIER, Jean-Jacques. As grandes obras políticas de Maquiavel a nossos dias. Rio de Janeiro: Agir, 2001. p. 285.
[62] BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 186.
[63] HABERMAS, Jürgen. A crise de legitimação no capitalismo tardio. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994.
[64] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 481, mai., 1999.
[65] HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre a facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. v. 2. p. 131.
[66] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 481, maio, 1999.
[67] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 481, maio, 1999.
[68] HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre a facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. v. 2. p. 131.
[69] MAULAZ, Ralph Batista de. Estado de Direito: discussão a partir da formação do Estado moderno e do direito contemporâneo. Franca: Faculdade de Direito, 2001. p. 170. Dissertação (Mestrado em Direito) – UNIFRAN, 2001. 194p.
[70] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
[71] GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria da ciência jurídica. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 144.
[72] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 387-397.
[73] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 482, maio, 1999.
[74] Cf. DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously. Cambridge: Havard Universit Press, 1999. p. 22-31. GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais. São Paulo: Celso Bastos, 1999. p. 51-54. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 228-266. CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos pragmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado Democrático de Direito. Revista de Direito Comparado. Belo Horizonte, v. 3, p. 482, maio 1999. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra: Almedina, 1999. p. 1086 et. seq. GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 75-123. LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997. p. 182-201, 209-215, 510-517, 574 et seq. CHUEIRI, Vera Karam de. Filosofia do direito e modernidade: Dworkin e a possibilidade de um discurso instituinte de direitos. Curitiba JM, 1995. p. 67 et. seq.
[75] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 482, maio, 1999.
[76] GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria da ciência jurídica. São Paulo: Saraiva, 2001.  p. 145, nota 242. Cf. ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997. p. 81-115. Cf. GALUPPO, Marcelo Campos. Os princípios jurídicos no Estado democrático de direito: ensaio sobre o modo de sua aplicação. Revista de informação legislativa. Brasília, v. 36, n. 143, p. 191-209, jul./set., 1999.
[77] HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre a facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. v. 1, p. 246.
[78] GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria da ciência jurídica. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 146; PIMENTA, Roberto Lyrio. Eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais programáticas. São Paulo: Max Limonad, 1999. p. 126.
[79] GUERRA FILHO, Willis Santiago, op. cit., p. 146.
[80] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 483, maio, 1999.
[81] Ibidem.
[82] GÜNTER, Klaus. The sense of appropriateness. New York: State University of New York Press. 1993.
[83] GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria da ciência jurídica. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 159.
[84] Id. op. cit., p. 158-159.
[85] CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do Estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, n. 3, p. 486, nota 254, maio, 1999.
[86] GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria da ciência jurídica. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 159-160.
[87] Id. op. cit, p. 156-157.
[88] CATTONI, Marcelo. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. p. 99-100.
[89] MÜLLER, Friedrich. Legitimidade como conflito concreto do direito positivo. Cadernos da Escola do Legislativo. Belo Horizonte, 1999. p. 26.

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